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Acórdão da 5ª Câmara Criminal absolve motorista de aplicativo condenado em primeira instância por estuprar uma passageira

Tribunal de Justiça do RS admite recurso especial interposto pelo Ministério Público
23/01/2020 Ascom Ministério Público – Foto: Divulgação

Em decisão publicada, a 2ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do RS admitiu recurso especial interposto pelo Ministério Público contra acórdão da 5ª Câmara Criminal que absolveu um motorista de aplicativo condenado em primeira instância por estuprar uma passageira. 

Assim, o Superior Tribunal de Justiça passará a analisar a demanda do MP para a condenação do réu. O recurso especial é assinado pelo coordenador da Procuradoria de Recursos, Luiz Fernando Calil, pela procuradora de Justiça Ana Maria Schinestsck e pela promotora-assessora Tânia Maria Hendges Bitencourt.

Na decisão, o 2º Vice-Presidente, Almir Porto da Rocha Filho, afirma que o acórdão recorrido violou os artigos 28, inciso II (a embriaguez não exclui a culpabilidade), e 217-A, parágrafo 1º (estupro de vulnerável), do Código Penal, “razão pela qual deve ser admitido o recurso especial”.

Depoimentos Ignorados

O recurso especial frisa que a 5ª Câmara Criminal omitiu, no acórdão que inocentou o réu, depoimentos de testemunhas de acusação. Uma delas afirmou que vítima “estava bastante bêbada, a gente tinha bebido bastante aquela noite, aconteceu que uma hora na festa ela já estava um pouco desmaiada, então o segurança ajudou a gente a trazer ela pra fora da festa, ali fora a gente ficou um tempo conseguindo acessar o celular dela, que ela não conseguia lembrar a senha do celular, aí quando ela conseguiu lembrar a senha, a gente chamou o Cabify, e a gente colocou ela no carro, no banco de trás”. Outra testemunha disse que a amiga “apagou, e ela não conseguia nem colocar a senha do celular”. Esses depoimentos, prestados ao juiz de 1º grau, foram levados em consideração para a condenação.

Culpabilização da vítima

Outro ponto apontado pela Procuradoria de Recursos é que o acórdão refere que “a vítima admitiu que por vezes já se colocava nesse tipo de situação de risco, ou seja, de beber e depois não lembrar do que aconteceu”. 

Nesse sentido, a decisão admite que, durante a conjunção carnal à qual foi submetida, a mulher estava em situação de risco – confirmando, portanto, a vulnerabilidade e incapacidade da vítima durante o fato narrado pela denúncia, o que confirma a ocorrência do crime previsto no artigo 217-A, parágrafo 1º, do Código Penal.

O acórdão recorrido “tem como viés a culpabilização da vítima, considerando o seu histórico (supostamente desabonador, de ‘por vezes’ consumir bebidas alcoólicas) como fundamento para afastar a responsabilidade do réu”, pontua o recurso especial.

Presumida idoneidade do motorista

Ainda, a compreensão do MP é de que a decisão se mostra contraditória ao reiterar que a vítima “afirmou não lembrar de nada” como fundamento para a absolvição, na medida em que tal circunstância apenas evidencia o estado de absoluta incapacidade em que se encontrava quando foi violentada.

O recurso especial frisa que o acórdão tomou a suposta irresponsabilidade de pessoas que confirmaram ter presenciado a absoluta incapacidade da vítima e não terem adotado outras medidas para a sua proteção como fundamento para a absolvição. 

“Não se pode ignorar ser razoável que as testemunhas que acompanhavam a vítima e a colocaram dentro do veículo em estado severo de embriaguez presumissem a idoneidade de motorista regularmente inscrito em aplicativo, destinado exatamente ao transporte de passageiros”, aponta o recurso especial.

Não existe prova tarifária

O MP entende, ainda, que o acórdão da 5ª Câmara Criminal mostra-se contrário ao entendimento do STJ quando refere que não havia prova do estágio de embriaguez incapacitante da vítima, pois não foi feito exame de alcoolemia.

Conforme julgamento em habeas corpus do STJ (HC 361.019/SC, QUINTA TURMA, DJe 10/10/2016), “não existe prova tarifada no nosso ordenamento jurídico, podendo as instâncias ordinárias, soberanas na análise fático-probatória, levar em consideração todas as circunstâncias e provas produzidas durante a instrução criminal que entenderem relevantes para a solução da controvérsia”.

Nesse sentido, argumenta a Procuradoria de Recursos, independe de confirmação eventualmente fornecida por prova técnica, fica evidente a “embriaguez completa” em que se encontrava a vítima no momento da violência.

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